segunda-feira, 12 de novembro de 2012



O epicurismo
 Existe um blogue português (no Blogspot.com) com o título “De Natura Rerum”. Este é o título de um poema de Lucrécio, um cidadão romano contemporâneo de Júlio César, que sofria de ataques de loucura a espaços e que se suicidou na sequência de um estado de loucura definitivo. Em suma, Lucrécio escrevia bem, mas era maluco — tal como Nietzsche. Lucrécio seguia a doutrina de Epicuro (o epicurismo), um grego de origem humilde e mesmo pobre que viveu entre o século IV e III a. C., e que criou a sua academia já na época helenística — ou seja, no tempo grego depois da morte de Alexandre.


Epicuro


O epicurismo não era propriamente uma filosofia (ou uma doutrina ou sistema filosófico), mas antes uma ética. Não era uma filosofia porque não teve a preocupação necessária com a ciência do seu tempo (que incluía a lógica-matemática e a lógica-dialéctica, preocupações de filósofos, por exemplo, como Platão e Aristóteles). O único interesse de Epicuro em relação à ciência teve a ver com a sua preocupação de refutar a religião; se existissem, por exemplo, duas teses científico-naturalistas que colocassem em causa uma determinada manifestação fenoménica atribuída aos deuses do Olimpo, para Epicuro não era importante saber qual das duas teses científicas era a verdadeira (e não dava nenhuma opinião sobre a credibilidade de uma ou de outra): para ele, as duas teses eram igualmente boas porque refutavam a religião. Refutar a religião — no sentido da transcendência ou mesmo no da imanência intracósmica da intervenção dos deuses do Olimpo na vida dos homens — era o único interesse de Epicuro.



A ideia de que Epicuro é o “pai da ciência”, proclamada por Lucrécio, é totalmente falsa e só pode ter vindo da cabeça de um louco. Podemos dizer que o pai da ciência é Demócrito ou mesmo Aristóteles, mas nunca podemos, em verdade, atribuir esse epíteto a Epicuro. Este foi um eticista e não um filósofo.

Não existiu em Epicuro nenhum interesse na investigação da natureza ou das ideias; pelo contrário, ele era contra a cultura, contra a leitura, contra o conhecimento e contra a investigação filosófica. Escreveu ao seu discípulo e jovem amigo Pitocles (Epicuro gostava muito de jovens): ” …foge de toda a forma de cultura”. (1)

O estóico Epícteto diz, referindo-se a Epicuro: “A vida a que dás valor é comer, beber, evacuar, copular e ressonar.” (1) Porém, não podemos dizer, em verdade, que Epicuro comia bem e bebia melhor, porque vivia à custa daquilo que lhe ofereciam e sem trabalhar; e em relação à cópula, a ideia de um Epicuro hedonista não é totalmente verdadeira. A relação sexual (entendida como o sexo separado do amor ou da paixão) era entendida por Epicuro como um “mal a conter”, e o sexo amoroso e apaixonado era criticado e desprezado. Epicuro gostava das crianças dos outros, mas era contra o casamento e contra a maternidade e paternidade (tirem as conclusões que quiserem). Podemos dizer que o epicurismo era uma espécie de niilismo materialista, de tipo “Dawkins”, naturalista e relativista moderno, misturado com um utilitarismo de tipo “Bentham” ou “Peter Singer”.

Sendo uma ética, tratava-se de um sistema prático (na opinião de Epicuro) para uma vida feliz. Esse sistema prático era baseado em uma espécie de “evangelho da libertação do medo” da morte e do inferno, o que transformou o epicurismo em uma espécie de religião. O epicurismo era uma religião que combatia as outras religiões na luta por um exclusivismo religioso — um pouco como acontece hoje com o naturalismo gnóstico e ateísta (não esquecer que um ateu pode não ser naturalista, enquanto que um naturalista é sempre um “ateu religioso”).
(1) W.J. Oates — The Stoic and Epicurean Philosophers

http://espectivas.wordpress.com/2010/05/02/o-epicurismo/

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